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Resumo do livro “Portugês ou Brasileiro? Um convite à pesquisa”, de Marcos Bagno.


Autores : Ingrid Constantino de Souza, Maria Eduarda Luporini Bitar e Patrick dos Santos de Souza.


Sabe-se que desde a Antiguidade greco-latina há a preocupação de se estudar a linguagem. Aqueles que estudavam a palavra, os filólogos, se ocupavam de formalizar as regras de línguas faladas para uniformizar suas estruturas para aqueles que desejavam criar textos literários; deste modo surgiram as gramáticas.

Marcos Bagno em “Portugês ou Brasileiro? Um convite à pesquisa”, entretanto, retoma este período histórico de início da tradição de produção de gramáticas com menos ingenuidade. Para o autor, fica claro que já neste período da Antiguidade greco-latina havia uma pretensa noção de pureza linguística:


“Os estudiosos da grande literatura clássica da Grécia estavam muito preocupados em preservar na maior ‘pureza’ possível a língua grega, que naquela época já estava muito diferente língua usada pelos maiores poetas e escritores do passado” (BAGNO, p.15)

 

Estes estudiosos na Antiguidade dividiram a língua em três partes bem delimitadas: língua escrita literária, língua escrita e língua falada, de modo que a língua escrita com finalidade literária era seu objeto de interesse.A importância dada à língua escrita em detrimento pela língua falada demonstra o caráter essencialmente elitista da Gramática, que desde seus primeiros empenhos desprezou todo o uso oral das línguas para se concentrar apenas no uso feito pelas poucas pessoas que sabiam ler e escrever (BAGNO, p. 16, 2001).

É neste contexto histórico que as gramáticas de língua grega e latina surgem, portanto. Ao longo do tempo, a língua literária escrita exerceu influência sobre as poucas pessoas que dominavam a língua escrita da época, que, por sua vez, impôs suas regras à língua falada; deste modo, a Gramática tornou-se um modelo sobre aquilo que é língua e aquilo que não é:

“Uma régua serve para medir o que está reto e para corrigir o que não está correto. Foi por isso que, durante mais de dois mil anos, se cristalizou na mentalidade comum a idéia de que o que não está na gramática não é correto, é errado e deve ser corrigido. Não é assim até hoje? (...)

Este tem sido o principal problema do uso da Gramática Tradicional durante os últimos vinte e três séculos: criada para servir de régua/regra para a língua escrita literária, ela passou a ser usada para medir e regular/regrar todo e qualquer uso linguístico.” (BAGNO, p. 18)

 

Na gramaticalização das línguas modernas ocorreram diversas incoerências e problemas, como Bagno ressalta: “essas obras tentaram encontrar, nas línguas vivas da época, as mesmas categorias gramaticais descritas pelos respeitados gramáticos da Grécia e de Roma.” (BAGNO, p. 18), desconsiderando as particularidades de cada língua. As Gramáticas Tradicionais do português, por exemplo, conceituam artigos em dois tipos: definidos e indefinidos. Definidos como artigos que têm sentido particularizante, na forma de o, a, os,as; e indefinidos como artigos que têm sentido genérico, na forma de um, uma, uns, umas. Para ilustrar o ponto, Bagno usa algumas expressões, dentre elas, duas: “O homem é mortal” e “Dizem que o brasileiro em geral tem o ouvido musical”:

“Se, como dizem os autores da gramática citada, o artigo definido tem ‘sentido particularizante’, qual é o homem particular que é mortal? Ora, todos os homens são mortais. (...) Se o artigo definido tem seu sentido geral particularizante, como é possível dizer que o brasileiro em geral tem ouvido musical? (...) É muito interessante ver que, nos exemplos acima, o artigo definido equivale a ‘todo, todos’ que, na nomenclatura tradicional, são classificados como pronomes indefinidos, quando na verdade o artigo definido e o pronome indefinido TODO agem como um quantificador, o mais geral de todos, o quantificador universal.” (BAGNO, p. 20)

 

Sem contar que as classificações rígidas das palavras não atingem certas mudanças e transformações que as sociedades criam. Outro exemplo são os substantivos que podem também ser adjetivos: "Filme cabeça", "Uma senhora Casa".

Percebe-se que a Gramática Tradicional está amparada por conceituações que não refletem a língua portuguesa. De tudo isso, se conclui que a Gramática Tradicional não tem bases científicas consistentes. Seus preceitos são o resultado de um processo bastante perverso: a transformação em dogmas, em "verdades" definitivas, de um conjunto de especulações filosóficas (BAGNO, p. 22, 2001).

A respeito das línguas portuguesas faladas em Portugal e no Brasil, Marcos Bagno defende que há mais diferenças do que semelhanças, por isso deveriam ser consideradas línguas distintas. A título de exemplo, Bagno diz:

“Há construções perfeitamente normais no português do Brasil que soariam agramaticais (inaceitáveis ou incompreensíveis mesmo) para falantes do português de Portugal. Por exemplo:

(1) Eu vim de táxi porque meu carro está consertando: ele quebrou a barra da direção.

(...)

Em (1) temos um fenômeno muito interessante chamado ergatividade. Nas construções ergativas, o sujeito do verba é na verdade o objeto da ação praticada. Quando nós, brasileiros, dizemos, com a maior naturalidade deste mundo, ‘o carro está consertando’, estamos colocando o carro como sujeito (função gramatical que corresponde tipicamente ao agente), quando de fato ele é o paciente: alguém está consertando o carro. O mesmo se aplica a ‘ele quebrou a barra da direção’: alguma coisa quebrou a barra de direção, ou a barra de direção se quebrou. O português de Portugal não conhece esse tipo de construção ergativa e um falante daquela língua consideraria o enunciado (1) truncado, esquisito ou totalmente agramatical. Para nós, no entanto, não tem nada de estranho dizer ‘o pneu furou’, ‘a calça rasgou’, ‘o vaso quebrou’ e assim por diante” (BAGNO, p 169)

 

Compreende-se ao longo do livro que as duas línguas portuguesa não são vistas como diferentes pois têm morfologias e léxicos semelhantes, entretanto, como visto, os usos sintáticos e lexicais são diferentes, como também são a prosódia, entonação etc. (BAGNO, p. 171).

A permanência da noção destas duas línguas como uma só, muitas vezes, pela herança da colonização e pelo fato Gramática Tradicional ser feita com base na variante portuguesa, há uma noção de que a variante brasileira é “errada” e “corrompida”, pois só a portuguesa parece “pura”. Esta noção mina a autoestima do falante da variante brasileira, uma vez que se estabelece que esta não é a sua língua, é a do outro, que lhe está “emprestada”:

“Dizer que a língua falada no Brasil é somente o ‘português’ implica um esquecimento sério e perigoso: o esquecimento de que tem muita coisa nesta língua que é caracteristicamente nossa, de que esta língua é parte integrante da nossa identidade nacional, construída a duras penas, com o extermínio de centenas de nações indígenas, com o monstruoso massacre físico e espiritual de milhões de negros africanos trazidos para cá como escravos, e com todas as lutas que o povo brasileiro enfrentou e continua enfrentando para se constituir como nação.


Por outro lado, dizer que nossa língua é simplesmente ‘brasileiro’ significa também operar outros esquecimentos, outros silenciamentos: o esquecimento do nosso passado colonial, que não pode ser apagado porque é história, e a história não é passado: é presente, premente, insistente. Somos um país nascido de um processo colonial, com tudo o que isso significa.” (BAGNO, p. 176)

  O livro “Portugês ou Brasileiro? Um convite à pesquisa” não somente propõe um debate acerca do ideal que a Gramática Tradicional, pois acredita que um único modelo de língua despreza as muitas culturas coexistentes e suas maneiras idiossincráticas de produzir língua, como defende o português brasileiro como uma língua apartada, desde 1500, do português de Portugal, para a construção de uma política linguística e educacional brasileira, bem como uma autoestima nacional, pensada a partir de suas características, deixando o ideal colonizador à sombra.



Referências Bibliográfica


BAGNO, Marcos. Português ou Brasileiro?: Um convite à pesquisa. 3. ed. São Paulo: Parábola, 2001.

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